
"O Colibri" (Sandro Veronesi, Ed. Autêntica Contemporânea) é um romance em que a saga familiar de Marco Carrera - um mero oftalmologista - é narrativamente tecida com os fios das perdas e impossibilidades que marcam sua vida.
A história começa quando Marco recebe em seu consultório um desconhecido, que sabe tudo sobre seu passado e o avisa de que corre perigo. Essa revelação desencadeia um longo fluxo de recordações, que avançam e retrocedem entre várias décadas dos séculos XX e XXI, evocando traumas, dores, recuperação... tudo ao mesmo tempo.
Apesar das adversidades, Marco encontra forças para se reerguer e seguir em frente, impulsionado pelo amor, cuja essência complexa - múltiplas formas e imperfeições, algo desejado e ao mesmo tempo inalcançável - é revelada ao longo da trama.
Com referências literárias, musicais e artísticas que enriquecem o universo do romance, Veronesi nos desafia com suas técnicas dialógicas, incorporando versos, conversas no whatsapp, inventários, frases e passagens de outras obras, criando um mosaico literário que transcende os limites do próprio livro, e da capacidade do seu dispositivo de lidar com a sobrecarga de abas e janelas abertas.
Confesso que tenho uma certa preguiça sobre a experiência masculina [risos] e estou um pouco cansada dos romances (e filmes) que usam o dispositivo de abertura impactante, seguido de seus desdobramentos, MAS sinto que em "O Colibri" a curiosidade se sustenta, pois a trama se desenrola em um ritmo sereno, com um tom mais contido, revelando a humanidade das personagens de maneira gentil.
E o que realmente me pega, como a louca das estruturas, é a forma polifônica do romance, que lhe confere originalidade, permitindo que as vozes das personagens se entrelacem à vida do protagonista, por meio de correspondências e diferentes perspectivas, culminando em uma experiência narrativa que, no fim das contas (me rendi, vai?!) é envolvente. E sim, particularmente amo como essas escolhas são feitas na não linearidade na organização da obra, com oscilações temporais e revelações progressivas, que adicionam camadas de complexidade que, em última instância, nos mantêm presos - esperançosa (e curiosa) para saber se a adaptação audiovisual consegue fazer o mesmo. A ver.
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